A DESCONFIANÇA DOS INVESTIDORES
Antonio Roque Citadini
Os investidores do mercado de capitais ainda nem conseguiram se refazer do susto que lhes deu a quebra da Enron e já foram surpreendidos com a notícia da fraude contábil praticada pela WorldCom, empresa americana e também de grande porte. Significativo notar que o balanço fraudado tenha sido auditado pela mesma empresa independente, a Arthur Andersen.
Desta feita, a fraude praticada e de considerável valor – US$3,8 bilhões – revestiu-se de tamanha singeleza que, talvez por isso, nem tenha sido imaginada pelos profissionais da auditoria responsáveis pela validação do balanço patrimonial da WorldCom. Entre outras, fica a lição que auditoria é uma tarefa que não permite cega confiança nos dados apresentados pela empresa auditada.
O auditor precisa certificar-se de que os documentos que originaram os lançamentos das receitas e das despesas guardam fidelidade e merecem crédito.
Sem dúvida, torna-se impraticável ao auditor examinar todos os documentos, mas precisará aplicar técnica apropriada e usar de perspicácia para detectar e
impedir a prática de fraudes. O auditor precisa, também, ter convicção que os lançamentos estão de acordo com as normas técnicas aplicáveis e terá de fazer isso para não oferecer um laudo de auditoria enganoso.
Por outro lado, sabendo-se que a Arthur Andersen era, também, a empresa que prestava serviços de consultoria para a WorldCom, fica consolidada a lição da incompatibilidade que existe entre as atividades de auditoria e de consultoria.
Não podem, as empresas de auditoria independentes, prestar consultoria a seus clientes aos quais auditam. Há muito tempo venho defendendo esta posição e agora, felizmente, já posso ver que outras vozes se levantam concordando.
Já se defende, agora, nos Estados Unidos, que a SEC (Securities and Exchange Commission) – que corresponde à Comissão de Valores Mobiliários, no Brasil – regulamente as atividades das empresas de auditoria, proibindo-as de vender aos seus clientes outros serviços, principalmente os da consultoria. No Brasil, a CVM adotou regulamentação nesse sentido que foi questionada judicialmente e, possivelmente por falta de clareza nas contra-razões apresentadas, foi concedida liminar. Espera-se que, no mérito, o julgamento mantenha a proibição em tão boa hora aplicada.
A evolução dos meios de comunicação, proporcionando imensa rapidez na divulgação e troca de informações, hoje globalizadas, é de
tamanha grandeza que causa um certo desespero aos executivos e profissionais que precisam tomar decisões. Não há tempo a perder. O ganho precisa ser cada vez maior e sempre de modo mais rápido.
Na linha da obtenção do lucro cada vez maior caminharam, também, as empresas de auditoria independente e encontraram como filão a atividade de consultoria que prestam às suas clientes auditadas. Prova disto é a notícia de que a Arthur Andersen cobrou da WorldCom US$4,4 milhões pelos serviços de auditoria e US$12,4 milhões pela consultoria.
Embora o mercado de capitais seja de risco – que é maior, médio ou mínimo, dependendo das inúmeras variáveis aplicadas ao sistema -, o investidor há de ter certos parâmetros nos quais confie. Os investidores não podem, de forma alguma, contar com qualquer tipo de truque contábil, que é, de longe, muito diferente do risco a que se propõem.
A existência de truques compromete a confiabilidade – e precisam ser combatidos e banidos, sob pena de desestruturação do mercado.
Todos os setores precisam estar atentos para isto, a fim de impedir sua prática e os eventuais culpados devem ser severamente punidos. É o que se espera.
(Diário Comércio & Indústria, DCI, Opinião, 10-07-2002, p.A-2)