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Condenação de ex-governador por gastos com festa em 1982

18ª. Sessão Ordinária da Primeira Câmara, realizada em 29 de junho de 1989, no auditório “Prof. José Luiz de Anhaia Mello”

PRESIDENTE E RELATOR – Conselheiro Antonio Roque Citadini

PROCURADORA DA FAZENDA – Bela. Anna Maria Ribeiro Bonchristiano

SECRETÁRIO – Bel. Sérgio Ciquera Rossi

PROCESSO – GG-274/82

ASSUNTO – Prestação de contas de Satiko Ikeda Asano, da Casa Civil, do adiantamento de NCz$ 40.810,00, referente ao mês de maio de 1982.

PRESIDENTE E RELATOR – GG-274/82 – Examina-se nesse processo, prestação de contas de adiantamento sob a responsabilidade de Satiko Ikeda Asano, destinado a fazer face a despesas com representação do Governador do Estado, no mês de maio de 1982, no valor de Cr$ 40.810.000,00, importância essa despendida com despesas do então Governador do Estado José Maria Marin.

As contas mereceram a aprovação do Governador, conforme despacho de fls. 5. A documentação comprobatória ficou retida na Casa Civil, nos termos do item XVIII das Instruções 2/74 deste Tribunal, tendo sido conferida “in loco” por funcionários da nossa Diretoria de Exame de Adiantamentos.

Esclarece o informante terem sido despendidos, por conta do adiantamento, Cr$ 25.315.934,00, procedendo-se o recolhimento dos restantes Cr$ 15.494.065,00 e considera a documentação em ordem, propondo, em conseqüência, a Sra. Diretora da referida Unidade deste Tribunal, a aprovação das contas e quitação da responsável.

A proposta é endossada pelo GFE.

A ATJ, após lamentar a ausência, em nossa legislação ou doutrina, de diretrizes ou parâmetros seguros que delimitem a natureza das despesas exigidas pela representatividade considera que a discricionariedade da autoridade é inefastável e é ela que delimita a situação fática que enseja as despesas de representação, e acaba por considerar as contas em ordem quanto aos seus aspectos formais, sem endossar seu mérito.

A SDG e a PFE acompanham o entendimento da ATJ .

Após essas manifestações foram juntados aos autos documentos informando que a documentação comprobatória das despesas, que havia ficado arquivada na Casa Civil, foi encaminhada a esta Corte de Contas e se encontra sob a guarda da Diretoria a quem são acometidos esses serviços.

Submetida a matéria ao Relator, então o eminente Conselheiro Nelson Marcondes do Amaral, foi determinada a manifestação do GTP sobre o aspecto da legalidade das despesas e sobre o aspecto da amplitude do poder discricionário do Estado para autorizá-las.

Antes de manifestar-se o GTP pediu a remessa deste à Diretoria de Adiantamentos para proceder levantamento idêntico ao já realizado no processo 443/81, que trata de matéria da mesma natureza, comentando detalhadamente as despesas realizadas, além da oitiva da Unidade Econômica da ATJ, a respeito dos aspectos econômico-financeiros. A Diretoria competente procedeu aos trabalhos solicitados pelo GTP e o detalhamento das despesas realizadas, encaminhando, a seguir, a pedido, os autos ao Relator que determinou o sobrestamento do julgamento da matéria aqui tratada, considerando o ajuizamento, na 6ª. Vara da Fazenda Estadual, de ação popular, impugnando, por lesivas ao Estado, despesas da espécie das constantes nos autos, justificando a medida pelo temor de que o julgamento desta Corte pudesse se constituir em “res judicata” àquela proferida pelo Poder Judiciário, determinando, outrossim, o prosseguimento da instrução, pelo GTP que, diante da discriminação dos gastos, encarece a necessidade de que se esclareça a que grupos foram oferecidos coquetéis ou jantares, alegando que, em processo idêntico, o Conselheiro Orlando Zancaner ordenora o recolhimento do valor das despesas relativas a refeições oferecidas a dirigentes de partido político e que se justificasse a duplicidade, e até triplicidade, de refeições de Assessores do Governo durante viagens, bem como se tais refeições não estariam proibidas pela Deliberação do Tribunal Pleno de 18-2-82. Solicitou, ainda, esclarecimentos sobre despesas com combustíveis feitas pelo Assessor.

Mais uma vez a Diretoria de Adiantamentos se manifestou, alegando que a duplicidade ou triplicidade de despesas com alimentação de Assessores deveriam, eventualmente, se referir a lanche, almoço e jantar, e que a Deliberação que vedou tal tipo de despesa é posterior à época da realização da aplicação deste adiantamento, não tendo o condão de retroagir seus efeitos. Quanto às refeições, oferecidas a grupos e às despesas de abastecimento de veículo, poderiam, somente, ser esclarecidas pela responsável pelo adiantamento.

Em face da sentença prolatada pelo Poder Judiciário, por despacho do Relator, retornaram os autos à ATJ para manifestar-se sobre a tramitação processual e à [BÁ para indicar as despesas consideradas lesivas ao Estado pela Sentença do MM. Juiz da 6ª. Vara.

A ATJ propôs a continuidade do sobrestamento do processado, no que foi acompanhada por GTP e PFE.

Relacionou a Diretoria de Adiantamento as despesas aqui examinadas iguais às impugnadas pela R. Sentença; referem-se a gastos com flores.

A E. Primeira Câmara determinou o sobrestamento deste processo até a decisão da matéria pelo E. Tribunal de Justiça do Estado.

A seguir, como medida de cautela, determinou o envio dos avios à PFE, consultando sobre a conveniência de se requerer eventual medida judicial de interrupção de prazo.

A Procuradoria da Fazenda manifestou-se alegando que, sendo o prazo para prescrição de 20 anos, não haveria, no momento, necessidade de interposição de tal medida.

Os autos ficaram, então, sob a guarda da ATJ, que acompanhou o andamento da ação até seu julgamento, que se deu no final de 1986.Após essa decisão judicial, a ATJ, acionada por despacho do Relator, entendeu conveniente, desde logo, a apreciação das contas, por considerar completa sua instrução que conta, inclusive, com subsídios colhidos junto ao Poder Judiciário.

Os autos continuaram sobrestados até o início do ano vertente, quando, já na condução da instrução, por entender como a ATJ, solicitei manifestação da PFE a respeito do mérito das contas.

A Procuradoria da Fazenda do Estado manifestou-se pela aprovação das contas e quitação do responsável.

De posse de todos esses elementos, e na qualidade de Relator do feito, arrolei, a fls. 173 a 176, dezessete itens, onde discriminei despesas que, a meu ver, não merecem aprovação, considerando tratar-se a verba de representação de numerário com característica de intransferibilidade por ser verba personalíssima, e por não se admitir sua inadequada utilização, face à existência de recursos próprios oferecidos por outras dotações orçamentárias.

Desses itens, o primeiro refere-se a pagamento de serviços especiais prestados por funcionários e servidores do Palácio; do 2º ao 12º, referem-se a jantares e coquetéis realizados, praticamente, em dias subseqüentes e sem qualquer justificativa; os itens 13 e 14 dizem respeito a coquetéis oferecidos a participantes de Congressos, o item 15, ao pagamento de organista para apresentação durante simpósio; o item 16, a despesas realizadas por Assessores e, finalmente, o item 17, a diversos presentes oferecidos a várias pessoas no correr da segunda quinzena do mês de maio de 1982.

Determinei, então, a notificação, nos termos do art. 32, da Lei nº. 10.319/68 da responsável Da. Satiko Ikeda Asano e dos ordenadores Srs. Calim Eid e José Maria Marin, para procederem ao recolhimento da importância correspondente às despesas impugnadas ou apresentarem defesa.

Devidamente notificados, os interessados apresentaram, por intermédio de seus procuradores, razões juntadas a fls. 186 a 209.

A responsável pelo adiantamento alega sua subordinação hierárquica ao ordenador da despesa, razão que a levou a efetuar os pagamentos, considerando-se, assim, desobrigada das responsabilidades decorrentes das mesmas, pedindo sua exclusão do feito.

A defesa apresentada pelo sr. Calim Eid, da mesma maneira invoca a condição de executor de tarefas instrumentais e meramente burocráticas de que se incumbia o ordenador da despesa, condição esta que não lhe permitia alterar compromissos políticos agendados, cancelar viagens ou solenidades assumidas pelos Governadores em exercício, sob pena de avocar, para si, decisões a personalíssimas e de competência exclusiva dos então Chefes do Executivo, não lhe cabendo, também, qualquer juízo de valoração desses eventos, pedindo, assim, a exclusão de sua responsabilidade.

Finalmente, a defesa do Sr. José Maria Marin, após lembrar que estes autos estiveram sobrestados, com vocação para assim permanecer até o julgamento da “ação popular” já noticiada, e traçar considerações a respeito da natureza da verba de representação, pede a prosperidade do sobrestamento anteriormente decidido ou, na hipótese contrária, a simples aprovação das contas apresentadas.

Resumidos os principais pontos que compõem a instrução do feito, passo às minhas considerações.

Patente está a diversidade de aspectos de que se reveste a matéria aqui tratada. Assim, o primeiro a ser enfocado é a conveniência da apreciação e julgamento destas contas, enquanto ainda tramita recurso de agravo de despacho e argüição de relevância, junto ao Supremo Tribunal Federal.

Considero desnecessário estudo mais profundo a respeito desta questão, face à Jurisdição própria deste Tribunal, não dependendo seu julgamento de decisões “judiciais”, como, aliás, lembra o então Relator, o ilustre Conselheiro Nelson Marcondes do Amaral, em seu despacho de fls. 60, por meio do qual de terminou o sobrestamento deste feito até a decisão judicial sobre a “ação popular” tendo, então, fundamentado sua decisão, notadamente em razões de prudência. Acresce o parecer da ATJ, a fls.93, que considera o sobrestamento desnecessário diante de nossa Jurisdição própria.

Entendo, pois, não existirem razões para se procrastinar ainda mais a apreciação destas contas e, além do a instrução do feito reúne elementos capazes de ensejar conhecimento de toda a matéria.

Corrobora, ainda, meu entendimento a posição da PFE, demonstrada a fls. 216 destes autos, onde o Sr. Procurador-Chefe considera terem as decisões do Tribunal de Contas eficácia no âmbito administrativo e que a precedência do Judiciário sobre este Tribunal, em processos autônomos que tramitam perante os dois órgãos, ainda que versando sobre a mesma matéria, fere as prerrogativas deste, cabendo ao interessado recorrer ao Judiciário se houver conflito nas decisões e propõe, afinal, o seguimento deste feito.

Para maior clareza, considero importante, apesar de saber que todos os ilustres Conselheiros aqui presentes estão a par do assunto, esclarecer que a “Ação Popular” de que se cogita, foi movida pelo Sr. Vanderley Macris, contra o ex-governador do Estado Paulo Salim Maluf, além dos Srs. Calim Eid, Ítalo Miguel e Sra. Marina Belisqui, acusando-os de uso impróprio de verba de representação. A referida ação correu na 6% Vara da Fazenda Estadual, por meio do processo nº. 392/82, tendo o MM. Juiz Titular, em sentença datada de 13-8-84, condenado os réus que, inconformados, usaram os recursos a que tinham direito, encontrando-se a matéria, segundo a última informação de que disponho, à espera de decisão do Supremo Tribunal Federal.

O terceiro aspecto que emerge da matéria em apreciação neste processo é o da natureza da verba de representação.

O Prof. Celso Antonio Bandeira de Mello dá a seguinte definição a respeito da natureza e finalidade da verba de representação:

“Verba de representação é a designação dada à importância pecuniária consectária a certos cargos de alta conspicuidade e em prol deles consignada, a fim de que seus titulares, para manter o decoro protocolar e o lustre compatível com a grandiosidade da função, possam efetuar despesas necessárias para resguardá-las. Se dela não dispusessem, careceriam de meios para atender satisfatoriamente as exigências da dignidade do cargo, pois teriam de suprir tais despesas às próprias expensas, ou, por omiti-las, comprometeriam a louçania que deve presidir-lhe o desempenho”.

Entende o jurista que essa “verba não se confunde com subsídios, vencimentos, honorários ou salários e, ao contrário destes, não é instituída em prol do indivíduo que ocupa o cargo, mas em favor da própria altaneria do cargo. Não se propõe a ser uma contrapartida econômica do munus público, do trabalho desempenhado. Não tem caráter retribuitório, alimentar ou proporcionador de meios de subsistência. Por isso, diferentemente das outras figuras referidas que se integram no patrimônio pessoal do agente, não é algo cuja disposição fique entregue ao líbito de quem faz jus a ela”.

Assim afirma “a impossibilidade da utilização dessa verba ao livre alvedrio de quem a recebe, asseverarão que a discricionalidade administrativa na sua utilização, por ampla que seja, deve ser despendida de acordo com a finalidade que lhe é própria (R.T.-591-janeiro de 1985).

Outrossim, ensina o mestre Rui Cirne Lima: “O fim – e não a vontade – domina todas as formas de administração”, e, ainda, “o bem não se entende vinculado à vontade ou personalidade do administrador, porém à personalidade impessoal a quem essa vontade deve servir”.

É patente, pois, e emerge de todos os ensinamentos ou de qualquer análise do assunto, que a aplicação do numerário correspondente à verba de representação tem seus limites e estes, indubitavelmente, são o interesse publico.

Nesta prestação de contas existe indicações de despesas realizadas de forma abusiva, sem qualquer vinculação com o caráter de representatividade e muito menos com o interesse público, e foram estas que destaquei e discriminei a fls.173/176 como impugnáveis.

Rejeitadas estas despesas, quem deve ser responsabilizado pela incorreta aplicação do adiantamento?

É esta a quarta questão a ser resolvida.

Em casos da espécie, este Tribunal tem entendido a posição de subordinação do funcionário a quem é acometida a responsabilidade por adiantamentos, via de regra, integrante de carreira da área administrativa, à autoridade a quem cabe exercer a representação, figurando a primeira, como mera executora de determinações da segunda, ou seja, como simples guardiã da importância monetária correspondente à verba. Assim convencidos, nossos julgadores têm isentado de responsabilidade o funcionário subordinado, atribuindo ao ordenador das despesas o ônus de ressarcir os prejuízos causados ao erário público.

Este é, aliás, o pedido contido na defesa apresentada por Da. Satiko Ikeda Asano, responsável por estas contas.

Prosperando este entendimento, resulta que os reais responsáveis pelas despesas realizadas indevidamente são os Srs. Calim Eid, Secretário de Estado e Chefe da Casa Civil, na ocasião de sua aplicação e o Sr. José Maria Marin, Governador do Estado no mesmo período.

Verifica-se que os eventos e viagens que deram origem às despesas impugnadas, ora são carentes de representatividade, ora descabidas, ora pertencentes a outras dotações orçamentárias.

É evidente que a responsável pelo adiantamento, que recebe esse encargo a partir de notas de empenho emitidas em seu nome, não tem poderes para determinar quais as categorias econômicas que devem ser oneradas para atender às diversas necessidades da dependência de sua lotação. O ordenador da despesa, no caso em pauta, o próprio Chefe da Casa Civil, ao contrário, tem poderes para tanto.

Não é compreensível, portanto, que ele aceite, por exemplo, pagamento de despesas com alimentação e pousada de assessores de ser Gabinete, por conta da verba de representação.

O Governador do Estado aprovou a prestação de contas, conforme despacho de fls. 2, dando, assim, seu “aval” aos gastos realizados. Destarte é, acima de todos, o maior responsável pelas irregularidades verificadas na aplicação da verba em exame.

Assim, considerando notadamente a falta de representatividade, a inexistência da finalidade precípua de tais gastos que é o interesse público, voto: 1) pela aprovação da parcela de Cr$ 32.022.592,50, com a conseqüente quitação; 2) pela aprovação da importância de Cr$ 8.787.407,50, correspondente às despesas que discriminei a fls., 173/176 e, por via de cem débito da mesma os responsáveis, Sr, Calim Eid e José Maria Marin, que deverão devolvê-la aos cofres públicos, acrescida de juros e correção monetária, por outro lado, pelos motivos atrás referidos, libero Da. Satiko Ikeda Asano da responsabilidade pelos gastos impugnados.

A matéria está em discussão.

CONSELHEIRO GEORGE OSWALDO NOGUEIRA – Solicitaria de V.Exa, citar quais as despesas impugnadas.

PRESIDENTE E RELATOR – Referem-se a uma seqüência de coquetéis, jantares e almoços, conforme fls. 173 e175 dos autos.

(Leitura por S. Exa. dos itens II a XII de fls. 173/175 dos autos)

Não foi possível a justificativa de quem foram as pessoas participantes.

Houve despesas realizadas em duplicidade, por assessores do Governador – 2 jantares e 2 almoços, com as mesmas pessoas.

Houve um coquetel oferecido em homenagem aos participantes do 28Q Congresso Mundial de Publicidade, do IAA, no dia 24/05/82, com a presença de 1500 pessoas.

Então, basicamente, são essas as despesas impugnadas, isto é, despesas em duplicata e despesas com almoços e coquetéis, sendo que os motivos e quais os participantes não foi possível identificar.

CONSELHEIRO GEORGE OSWALD0 NOGUEIRA – Obrigado. Essa questão de verba de representação do Governo do Estado surgiu nesta Casa num processo rumoroso. Foi com o ex-presidente da Assembléia Legislativa. Naquela oportunidade pugnou-se muito. De lá para cá o Tribunal abrandou muito sua vida, discordando, totalmente, dos ensinamentos de Bandeira de Mello, de todas as personalidades, de todos os juristas mencionados por V.Exa., para admitir despesas por verba de representação, feitas por Secretários de Estado, que nada têm a ver nem com a dignidade do cargo, nem com a representatividade do cargo, nem com a pompa, nem com a solenidade, com nada. Possuem caráter nitidamente alimentar e tem admitido que o Secretário de Estado coma sozinho em seu Gabinete e acha muito certo que essa pensão alimentar corra por conta da verba de representação. Acha muito certo que Secretários de Estado comam, com seus Assessores e aprova suas contas. Almoçam com os Diretores de empresas, com seus subordinados, almoçam com os deputados e seus correligionários políticos, almoçam com os prefeitos e seus correligionários políticos de uma determinada zona, seguidas vezes, num mesmo mês e este Tribunal considera legítima a situação. Tenho sido, e já estou cansado, voto vencido em quase todos os processos de prestação de contas de Secretários de Estado.

Ultimamente, até parei de votar contra porque não adianta ficar insistindo em que verba de representação não é verba alimentar, não é verba para ser gasta pelo Sr. Secretário no atendimento de reuniões com almoços e jantares com seus assessores, ou com os assessores de outras Secretarias, com funcionários de outras Secretarias, e nem com outros Secretários. Mas há uma, coisa em que estou plenamente de acordo com a orientação deste Tribunal: é que não há necessidade da identificação do pessoal do favorecido pelo gasto efetuado pela autoridade pública. Se o Governador do Estado se vê obrigado a mandar um brinde a alguém por uma cerimônia de casamento, na qual foi convidado exclusivamente por ser Governador do Estado e não por ter relação de amizade com os pais dos noivos e nem com os noivos. Vamos dizer que o filho de um Ministro de Estado se casa. Ele é obrigado a mandar um brinde por ser do protocolo. Ele não precisa discriminar isso nas suas contas, são pormenores. Mas, evidentemente, no caso em tela, não se tratam de jantares. O que V.Exa, apresentou, realizado pelo Governador José Maria Marin, foram uma série de banquetes com 150, 170, 110 participantes. Não é jantar oferecido a uma pessoa, a um grupinho, é uma festividade e, evidentemente, há de ser indicada a razão de sua realização. Não é preciso que se diga quem foi lá participar da festividade, mas é dizer que festividade é essa. De modo que, nesta parte, concordo com V.Exa. Concordo, também, quanto ao absurdo da apresentação de comprovantes, de vários comprovantes para uma mesma despesa. Quer dizer, não é possível um homem jantar duas ou três vezes

num mesmo dia!… Isto creio que não se trata, evidentemente, de falha do Governador nem do Chefe da Casa Civil, e sim, de algum servidor, mas, que deveria ter sido fiscalizado por quem de direito, dentro do Palácio.

Eu não sei por que a Procuradoria disse que a prescrição da matéria é em 20 anos porque ato de Governador de Estado dessa natureza, para mim, envolve crime de responsabilidade, que deveria ser julgado pela Assembléia Legislativa e dar-se-ia a prescrição lá. Fora disso, só teria a ação de cobrança. Deixando o Governo, S. Exa. não seria mais passível de sofrer a ação de responsabilidade.

Então, só seria a cobrança judicial ou ação popular. Uma e outra prescrevem em 5 anos. A ação de 20 anos talvez refira-se à prescrição apenas em relação à funcionária que nada tem a ver com o caso, porque ela é apenas a caixa, como disse bem V.Exa., e como é entendimento deste Tribunal. É a prescrição funcional.

Mas, eu observei que esse processo não está prescrito por um fato que foge a este Tribunal: a existência da ação popular. Não existisse a ação popular, nós não estaríamos aqui, não poderíamos estar aqui a cuidar mais desse processo, porque ele estaria prescrito no que diz respeito ao ex-governador.

Apenas chamo a atenção para isso e acompanho o voto de V.Exa.

PRESIDENTE E RELATOR – Continua em Com a palavra o Conselheiro orlando Zancaner.

CONSELHEIRO ORLARDO ZANCANER – Sr. Presidente, eu acompanho em parte V.Exa, e o Conselheiro George Oswaldo Nogueira nas suas considerações. Realmente, parece a queda do Império Romano. Eram festins constantes que se davam naquele tempo e que terminaram melancolicamente com a queda do maior império daquela época. Eu apenas iria mais longe: excluiria da responsabilidade o Chefe da Casa Civil. Ele é ordenador da despesa fisicamente apenas, é o homem que lança autorização emitida pelo Governador. Ele não tem outra função. Tão cabe a ele discutir se o Governador está certo ou errado naquilo que determinou. O Governador queria dar dez banquetes em dez dias. Ele cumpre ordens, como cumpre as ordens a funcionária subalterna ao Chefe da Casa Civil. Ele, para mim, não é o responsável pelos gastos efetuados, só o Governador. E, como disse bem o Conselheiro George Oswaldo Nogueira, não há necessidade de trazer a relação daqueles que participaram, nem isso se podia exigir de um governo como o Governo do Estado de São Paulo.

Mas, haveria de se exigir que os gastos fossem feitos e justificados com respeito efetivamente a uma determinada razão, qual seja uma festividade ou um congresso, por exemplo. Mas isso parece que era uma constante e os valores elevadíssimos. E é preciso punir esses gastos. Não se pode mais continuar a se gastar desordenadamente.

Veja, V.Exa., hoje, que a Nação não tem dinheiro sequer para importar vacinas para aplicação em crianças em todas as idades em todo o Estado, em toda a Nação. E nós continuamos aí a dar aprovação a gastos de verba de representação de Secretários de Estado, comendo com Prefeitos, como diz o Conselheiro George Oswaldo Nogueira, por uma, duas, cinco semanas, ou por vários meses seguidos, num prejuízo imenso ao Estado.

É preciso mudar essa orientação. Os tempos Os conceitos mudaram. A Nação mudou. Estamos pobres, mas muito pobres. É preciso que se pense um pouco quando se gasta desordenadamente e é preciso imediatamente que o mau administrador sofra uma ação pela responsabilidade dos gastos efetuados na má gestão, com seus bens, e aí veremos que cada um procurará agir melhor na defesa do interesse público.

Acompanho V.Exa. Apenas excluo o Chefe da Casa Civil, porque entendo que só fisicamente ele opõe sua assinatura e bate a nota de empenho.

PRESIDENTE E RELATOR – Srs. Conselheiros, acompanhei as decisões que a Casa tem mantido nesses anos todos, ou seja, o Chefe da Casa Civil, em outras decisões, tem sido responsabilizado juntamente com o Governador. Eu não inovei ao manter a responsabilidade do Governador e do Chefe da Casa Civil. Meu voto, neste caso, acompanha praticamente o voto do Conselheiro Orlando Zancaner, dado há muitos anos atrás em processo praticamente igual. Na verdade, meu voto acompanha quase que integralmente as impugnações ocorridas na época.

Quanto à questão da ação popular, Sr. Conselheiro George Nogueira, estive pesquisando e não encontrei vínculo da ação popular com esse processo. A ação popular lá é contra um outro Governador, com outro tipo de problema levantado de verba de representação do outro Governador. Na época, nosso anual Secretário Geral era Diretor da ATJ e opinou no sentido de que não havia vínculo algum entre o processo judiciário e este processo. Também confesso que não encontrei, muito embora houvesse lá uma questão pendente, poder-se-ia entender que se tratava de algo aproximado.

CONSELHEIRO ORLANDO ZANCANER – Sr. Presidente, no passado, realmente, era muito difícil alcançar-se o Governador, não tínhamos quase condições de fazê-lo, posteriormente, e o Direito se inova com a jurisprudência. Fomos, enfim, tendo condições de começar a amarrar as pontas e, agora, estamos começando a atingir condições para abarcar o Sr. Governador, e não há necessidade de mais nada, pois é ele o único e exclusivamente responsável por toda verba que lhe é entregue, que a destina a seu bel-prazer.

CONSELHEIRO GEORGE OSWALDO NOGUEIRA – Sr. Presidente, as razões do Conselheiro orlando Zancaner parecem-me perfeitas. Há casos e há processos em que o Chefe da Casa Civil é responsável, concomitantemente, com o Sr. Governador do Estado, mas no tipo de despesas realizadas, é evidente, que o Sr. Chefe da Casa Civil nada tem a ver, isto é decisão exclusiva do Governador que oferece festa, recebe para jantar, quem quiser, convida quem quiser, e é capaz de até o Chefe da Casa Civil ficar sabendo quem foi ao jantar. Se ele não quiser noticiar o Chefe da Casa Civil, este não fica sabendo.

PRESIDENTE E RELATOR – Concordo com V.Exa. Diria, apenas, o seguinte: neste sentido estamos inovando. Acolho a ponderação do Conselheiro George Nogueira e do Conselheiro Orlando Zancaner e, portanto, considero liberado o Chefe da Casa Civil, Sr. Calim Eid, neste processo, ficando a responsabilidade ao primeiro mandatário.

Continua em discussão. Em votação.

Aprovado o voto do Relator, com a alteração final.

Decisão constante da ata: A E.CÂMARA APROVOU A PARCELA DE NCz$32.022,60, QUITANDO-SE A RESPONSÁVEL E DESAPROVOU A IMPORTÂNCIA DE NCz$ 8.787,40, CONSIDERANDO A FALTA DE REPRESENTATIVIDADE E A INEXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO PARA TAIS GASTOS, JULGANDO O ORDENADOR DA DESPESA, SR. JOSÉ MARIA MARIN, EM ALCANCE E CONDENANDO-O AO RECOLHIMENTO, AOS COFRES PÚBLICOS, DA QUANTIA ALCANÇADA, ACRESCIDA DE JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA.

DECIDIU, AINDA, EXCLUIR A SRA. SATIKO IKEDA ASANO E O SR. CALIM EID DA RESPONSABILIDADE PELOS GASTOS IMPUGNADOS.

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VOTO DO CONSELHEIRO ANTONIO ROQUE CITADINI

(Processo nº. 274/82, fls. 173/)

Vistos.

Cuidam os presentes autos da Prestação de Contas de Adiantamento de Verba de Representação, no valor de Cr$40.810.000,00 (Quarenta Milhões, Oitocentos e Dez Mil Cruzeiros)

destinado ao período de 15 a 31 de maio àe 1982 e sob a responsabilidade de Satiko Ikeda Asano.

Tendo em vista que a finalidade precípua da dotação de verba para representação deve respeitar o estabelecido na Ordem de Serviço Interna nº. 1/77, aplicável ao caso por se tratar de verba personalíssima e com características de intransferibilidade, não há como se admitir a inadequada utilização da mesma quando existem recursos próprios por outras dotações ou, na maioria dos cases, confundida como se fosse para gastos pessoais e não no exercício do cargo de Governador de Estado, conforme a seguir exposto:
I – Em pagamento de serviços especiais prestados por funcionários e servidores do Palácio na organização e realização de solenidades e recepções oficiais, na manutenção e conservação, no transporte de visitas oficiais, (fls.11);
II – Jantar especial, realizado no dia 23/05/82, sem justificativa (g. n.), (fls., 12);
III – Em coquetel e almoço, realizado no dia 25/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
IV – Em coquetel e jantar, realizado no dia 25/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
V – Em coquetel e jantar, realizado no dia 26/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls. 12);
VI – Em coquetel e almoço, realizado no dia 26/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
VII – Em coquetel e almoço, realizado no dia 27/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
VIII – Em coquetel e jantar, realizado no dia 27/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
IX – Em coquetel e jantar, realizado no dia 28/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
X – Em coquetel e almoço, realizado no dia 28/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
XI – Em coquetel e jantar, realizado no dia 31/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls. 12);
XII – Em coquetel e almoço, realizado no dia 31/05/82, sem justificativa (g.n.), (fls., 12);
XIII – Em coquetel oferecido em homenagem aos participantes do 28º Congresso Mundial de Publicidade do IAA, no dia 24/05/82, com a presença de 1.500 pessoas, (fls. 12);
XIV – Em coquetel oferecido em homenagem aos participantes do V Simpósio Internacional sobre a Prevenção do Câncer, no dia 15/05/82, com a presença de 450 pessoas, (fls., 12);
XV – Em despesas com Organista durante o V Simpósio Internacional de Prevenção do Câncer, realizado em 16/05/82 (fls., 13);
XVI – Em despesas de Assessores se utilizando da verba de representação do Sr. Governador, (fls. 45/49), sobretudo os gastos de fls. 47, realizadas pelo Sr. Reinaldo da Silva.

SALA DAS SESSÕES, 29 DE JUNHO DE 1989.