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OS CARTÕES DE PAGAMENTO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

OS CARTÕES DE PAGAMENTO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Antonio Roque Citadini

Importante registrar que a administração pública no Brasil não é pioneira na implantação e na utilização de cartões de pagamento por seus servidores.

Segue nisto o exemplo de países mais avançados e de cuja prática as notícias eram e continuam satisfatórias. Trata-se, na verdade, de um aprimoramento das técnicas de administração geral, das quais se utiliza o serviço público, e que oferece transparência dos gastos sem dificultar as atividades de controle e de fiscalização.

É fato notório e reconhecido que o administrador – da iniciativa privada ou do setor público – se depara no seu dia-a-dia com um sem número de situações, umas rotineiras e outras emergenciais, que exigem decisão rápida para determinada compra ou contratação de bens ou serviços.

No setor privado, cada empresa regulamenta o assunto sob sua ótica, contemplando menor ou maior complexidade, dependendo do tamanho e do sistema administrativo e organizacional da empresa, podendo variar até em razão do ramo de atividades da empresa.

Já na administração pública, o seu regramento, como não poderia deixar de ser, deve obediência à legislação que disciplina o assunto.

Desde 1964, portanto há quatro décadas, está em vigência a Lei nº 4.320, federal, que trata do direito financeiro e que não sofreu alteração nessa particularidade, e, em cujo artigo 68 estabelece que o regime de adiantamento consiste “na entrega de numerário a servidor, sempre precedida de empenho na dotação própria, para o fim de realizar despesas que não possam subordinar-se ao processo normal de licitação.”

Já se pode ver que a regra para compras e contratações na administração pública é a submissão a processo de licitação, enquanto o regime de adiantamento se aplica àquelas despesas que não podem, justificadamente, aguardar os prazos de uma licitação, sob pena de causar prejuízos ou emperrar a administração.

No Estado de São Paulo, o assunto vem disciplinado pela Lei nº 10.320, que é de 1968, portanto, prestes a também completar, em dezembro próximo, o seu quadragésimo aniversário.

No ano de 2000, o governo estadual implantou, pelo Decreto nº 45.085/2000, o sistema eletrônico de compras e também o cartão de compras, facultando sua utilização pelos órgãos da administração direta, autárquica e fundacional; mais tarde, em 2002, pelo Decreto 46.543, passou a ser chamado de cartão de pagamento de despesas.

Antes do ano de 2000, no Estado de São Paulo os adiantamentos só eram concedidos mediante crédito bancário em conta aberta no banco oficial, em nome do órgão e movimentada pelo servidor responsável pelo adiantamento.

A regra legal ainda em vigor e respeitada é que cada servidor só pode ter no máximo dois adiantamentos em seu nome – e cada adiantamento para determinado tipo de despesa – não podendo, portanto, acumular adiantamentos. Isto vale, portanto, para o adiantamento, quer o órgão utilize o cartão de pagamento de despesa, quer não o tenha implantado e trabalhe na sistemática anterior.

O servidor que recebe um adiantamento deve prestar contas no prazo, o mais comum é de trinta dias, e se não o fizer ou se sua prestação de contas não for aprovada, estará impedido de receber novo adiantamento. O valor gasto há de ser comprovado por documentação hábil e em despesas que se enquadrem no tipo autorizado para a finalidade do adiantamento.

Cada adiantamento, portanto, é concedido para um tipo de despesa.

A prestação de contas é feita num processo que contém a documentação de despesa e a autorização competente do ordenador da despesa, sendo objeto de aprovação dos diversos níveis hierárquicos do órgão concedente e, no final, do Tribunal de Contas do Estado. Nos casos de irregularidade – e há registros de casos neste sentido – o servidor não recebe a quitação, pelo Tribunal de Contas, e é condenado a devolver o valor recebido, podendo, ainda, sofrer outras penalidades, decorrentes de processo administrativo e até na área criminal.

A novidade, portanto, implantada no ano de 2000, nos órgãos da administração direta, autárquica e fundacional no Estado de São Paulo, só está na substituição da utilização da conta bancária pelo cartão de pagamento de despesas.

Quer com a conta bancária, quer com o cartão havia a possíbilidade de o servidor fazer saque até o valor do adiantamento, impedimento que resolveu fazer o governo este ano, não por imposição legal, mas tão somente por decisão político-administrativa.

O cartão tem a vantagem de ter boa aceitação no mercado, fato que já inibia, na maioria das situações, a retirada do dinheiro em espécie, o que facilitava o servidor responsável que não precisava sacar e portar o numerário, e, em termos de fiscalização é também vantajoso porque o extrato do cartão possibilita o confronto das despesas efetivamente realizadas.

Entre as despesas que o artigo 39 da Lei 10.320/68 autoriza seja feita no regime de adiantamento, tem-se as despesas extraordinárias e urgentes; as de conservação; material de consumo; transportes; via de regra, as despesas miúdas e de pronto pagamento, que são dispensadas de licitação.

Logo, no regime de adiantamento é possível adquirir aqueles bens ou serviços de pequeno valor ou de caráter emergencial, e os que por previsão legal não precisam se submeter ao processo de licitação. Tal dispensa leva em conta que a exigência da licitação, em tais casos, poderia causar enormes prejuízos de ordem operacional para as atividades da empresa ou do órgão público. Pode ocorrer uma situação de emergência que exija rápida ação do administrador que resulte em despesa com compra de equipamentos ou transportes a ser suportada com verba de adiantamento.

Não se pode esquecer que na administração pública a regra é que todas as compras de bens ou serviços sejam precedidas de licitação. Assim, todos os fornecedores têm, em tese, o mesmo direito de concorrer para fornecer seus produtos aos diversos órgãos estatais, fazendo-o sempre em condições de igualdade de tratamento numa salutar competição.

Portanto, o adiantamento não se presta a suportar aquelas despesas que possam ser adquiridas seguindo as regras da licitação, sem prejuízo para o dia-a-dia do órgão público.

Vê-se que o regime de adiantamento não é assunto novo, está consolidado como uma prática aceitável e necessária para o funcionamento da máquina administrativa estatal, com mecanismos que permitem o efetivo controle e fiscalização dos gastos. Tem como vantagem a maior aceitação em relação a cheques e assim inibir que o servidor faça a retirada do dinheiro, o que agora no Estado de São Paulo não mais é permitido. Fazendo o pagamento diretamente ao fornecedor com o cartão, terá, também, a devida documentação fiscal que será da mesma data da saída do pagamento feito com o cartão.

A fiscalização, pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, está regulamentada pelas Instruções próprias que exigem estar no processo de prestação de contas documentos que comprovem a regularidade do adiantamento concedido e das despesas efetuadas. Exige, para tanto: cópia da nota de empenho; a autorização da autoridade competente; os originais dos documentos fiscais da despesa; e o comprovante do depósito bancário do saldo não utilizado.

A documentação comprovando a despesa deverá, ainda, estar acompanhada de relatório do exame analítico da utilização do adiantamento com ratificação da autoridade competente; declaração do recebedor das mercadorias ou dos serviços prestados.

Nota-se a preservação do acompanhamento do processo de despesas com o envolvimento de várias pessoas, exercentes de diferentes funções, como recomenda a boa técnica administrativa para facilitar a atividade de controle e fiscalização.

(*) Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo