INDÚSTRIA DA LAMA
TCE revela irregularidades em obra no Tietê
Preço de vários itens foi superfaturado em relação a 90; governo do Estado tem 30 dias para defesa
Xico Sá
Da Reportagem Local
Auditoria realizada pela Unidade de Engenharia do TCE (Tribunal de Contas do Estado) revela que a primeira etapa do Projeto Tietê, a maior obra do governo Fleury, teve concorrência-pública irregular e preços de vários itens superfaturados em valores superiores a 100%. Essa primeira etapa tem custo previsto de US$88 milhões.
Em o todo o projeto, o governo prevê gastos de US$2,6 bilhões.
A Folha revelou, em abril, a existência de uma “indústria da lama” em São Paulo. Segundo a reportagem: o governo paulista paga mais caro do que outros Estados e municípios pelo serviço de desassoreamento. A auditoria do TCE comparou preços praticados em contratos feitos no governo Quércia, em 1990, e agora na gestão Fleury.
O curioso é que a obra que serve de comparação para a auditoria já apresentava preços altos e indícios de irregularidades, de acordo com informações do próprio TCE. Além disso, a obra que serve de comparação foi feita por uma das mesmas empreiteiras, a Badra, que agora realiza, em consórcio com outras empresas, o Projeto Tietê de Fleury.
O corregedor do TCE, Antonio Roque Citadini, deu um prazo de 30 dias, conforme despacho publicado ontem no Diário Oficial do Estado para que o governo tente regularizar a situação da obra ou se defender judicialmente. Além da Badra, foram contratadas para o projeto as construtoras OAS, Enterpa e Ebec. O PT. o PPR e outros partidos de oposição em São Paulo irão tentar suspender o contrato. O deputado João Paulo Cunha (PT) já anunciou ontem que o seu partido irá à justiça com esse objetivo.
Nas várias tabelas produzidas por engenheiros e técnicos do TCE, o superfaturamento de preços é revelado através de comparações do Projeto Tietê (governo Fleury) com o contrato – para o mesmo serviço de desassoreamento – de 13 de Setembro de 1990 (governo Quércia):
Há irregularidades e preços elevados desde o custo por metro cúbico de lama retirado até o orçamento para pagar a mão-de-obra, com o trabalho de desenhistas, fotógrafos e secretárias.
Na obra de 1990 o custo do serviço no canteiro de obras por metro cúbico de lama retirado foi de US$42,31. Na obra de Fleury, o custo sobe para US$92,22. Isso significa uma diferença, com ampliação dos preços de 117%.
Logo para iniciar a obra, com a instalação do atual canteiro nas margens do rio. O governo começou gastando 180% a mais do que foi pago em 1990 (veja quadro nesta página).
OBRAS DO TIETÊ NOS GOVERNOS
QUÉRCIA E FLEURY |
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Serviço de retirada da lama do rio está cada vez mais alto. |
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Canteiro de obras |
Manutenção do canteiro/mês |
Custo por m3 de lama retirada |
Mão-de-obra |
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Quércia |
US$197.600,00 |
US$4.940,00 |
US$42,31 |
US$2,81/hora |
|
Fleury |
US$553.356,00 |
US$9.907,14 |
US$92,22 |
US$6,91/hora |
|
Diferença |
+180% |
+100% |
+117% |
+145% |
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O PLANTIO DE GRAMA CUSTA |
O CUSTO TOTAL DO PROJETO TIETÊ É DE |
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130%
a mais que o preço de mercado |
2,6
bilhões de dólares |
Até no preço da plantação da grama que hoje começa a enfeitar as margens do Tietê o Estado teria exagerado, segundo os orçamentos obtidos – em empresas do mercado pelos auditores do TCE. O governo Fleury pagou 130% a mais pela grama. Enquanto é possível fazer o serviço a um custo de US$1,20 o melro quadrado, o governo desembolsou US$2,80.
A situação da obra do rio se complica ainda mais pelo fato de a Procuradoria da Fazenda do Estado ter referendado as denúncias contidas na auditoria. Segundo despacho da Procuradoria, “o edital de licitação contém normas que frustam o caráter competitivo do certame”.
OUTRO LADO Governo vai analisar caso Da Reportagem Local A assessoria de imprensa do governo informou, após tomar conhecimento do resultado da auditoria, que o órgão escalado para responder às acusações seria a Secretaria de Recursos Hídricos, Saneamento e Obras. Procurada pela Folha, a a assessoria da Secretaria repassou o caso para o DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica) autarquia vinculada à Secretaria de Recursos Hídricos. O DAEE divulgou às 20h02, uma nota informando que a Secretaria está “tomando conhecimento do teor do despacho do TCE” e adotará “após análise, as providências necessárias para responder os questionamentos por aquele Egrégio Tribunal”. (Xico Sá) |
(Folha de S. Paulo, 06/08/93, P. 1-12)