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REVISÃO NO QUADRO DE ELEITORES

Antonio Roque Citadini

As declarações do deputado Ulysses Guimarães sobre o alistamento eleitoral, especialmente a respeito da existência de “eleitores fantasmas”, tiveram forte repercussão, principalmente da parte dos políticos da região nordeste do Brasil.

Em qualquer sistema eleitoral o credenciamento dos votantes é trabalho dos mais difíceis, já que, existindo qualquer dúvida nesta fase, estará comprometido todo o sistema eleitoral.

O alistamento dos eleitores é questão da maior relevância para todo o sistema partidário e eleitoral do Pais. se organizado de maneira correta e sem vícios, garantirá a expressão da vontade da população manifestada através dos pleitos, mas permitirá fraudes e deturpação se concretizado com distorções e equívocos.

A história eleitoral brasileira, especialmente a do Império e a da Primeira República, é farta em fraudes com os maiores vícios aparecendo na área do alistamento. somente no final do regime monárquico é que as inscrições eleitorais ganham o caráter permanente e passam a ser feitas pelo juiz municipal e organizadas por comarca, abolindo-se, assim, as antigas juntas de alistamento. É, no entanto, depois da Revolução de 1930, com a criação da Justiça Eleitoral, que o alistamento de eleitores passa a oferecer maior credibilidade ao País, sendo hoje, em números menores, os casos de irregularidades no processo de inscrição eleitoral.

Mesmo tendo maior credibilidade, dado o esforço da Justiça Eleitoral, é forçoso reconhecer que em várias regiões do País o alistamento dos eleitores apresenta sérias dúvidas.

Isso será facilmente constatado se consultarmos, mesmo que rapidamente, as decisões do TSE nos últimos anos, onde encontraremos lamentáveis processos de revisão de eleitores, com a fraude à inscrição aparecendo de forma cristalina.

Louve-se o esforço da Justiça Eleitoral que, nos anos de 1973 e de 1974, especialmente nos Estados do Piauí, ceará, Maranhão, Espírito Santo e Sergipe, procurou rever o eleitorado, tendo – lamentavelmente – sido desestimulada por uma decisão do TSE (Res. n.° 9.533, de 27-2.74), que restringiu o processo de verificação de eleitores apenas quando houvesse denúncia fundamentada de fraude.

Ora, dada a situação histórica de miséria em que vivem muitas regiões do País é praticamente inviável ficar-se à espera de denúncia ao alistamento, quando os dados de irregularidades são evidentes. Esta medida do TSE, atendendo um pedido do partido governista, em muito contribuiu para manter as dúvidas sobre o credenciamento dos eleitores.

Antes de ser suspensa – pela decisão do TSE citada – o trabalho de revisão determinado por vários juízes eleitorais trouxe mostra das falhas existentes no alistamento em vários Estados. Na revisão realizada no Ceará “constatou-se a existência de inscrições dúplices, do interesse de uma só pessoa, em municípios limítrofes, ensejando a prática do voto plural, por um mesmo eleitor”. (Res. n.° 9.663, de 6-11-74). No Piaui, na 30.ª zona, “determinado município chegou a dar um percentual de eleitores, sobre a população, de 85,4%”, quando a média de percentagem na região era de 30%. Nos 13 processos de revisão determinados cancelaram-se, “por sentença dos juízes eleitorais, 5.317 inscrições de eleitores, bem assim em sete processos, quando se cancelaram 8.000”. (Res. n.° 9.661, de 8-4-75).

Esses casos, trazidos apenas para efeito de ilustrar, constatam que o alistamento eleitoral ainda apresenta inúmeras falhas, embora, como afirmamos inicialmente, a Justiça Eleitoral tenha dado razoável dose de credibilidade na inscrição de eleitores.

Como vimos, não há porque tanta revolta com a afirmação do deputado Ulysses Guimarães sobre a fraude no credenciamento dos eleitores. Neste momento em que o País caminha para consolidar um regime democrático é a oportunidade ideal para uma revisão no quadro de eleitores.

(Diário Comércio & Indústria, 3/1/1985)