Antonio Roque Citadini
Um dado novo apareceu em todo o quadro da disputa sucessória: a Justiça Eleitoral. De repente, mais importante do que os votantes no Colégio Eleitoral que escolherão o próximo presidente da República são as decisões, consultas, resoluções e acórdãos do Tribunal Superior Eleitoral.
Os membros do TSE aparecem subitamente nas capas de revistas, têm seus currículos publicados nos jornais e até o parentesco é motivo de especulação jornalística.
Os candidatos à Presidência e seus advogados têm agora um novo campo de batalha e a cada decisão do TSE são refeitas as progressões eleitorais dos contendores.
Esta súbita importância do TSE tem uma explicação, pois sendo ele o maior orgão do Poder Judiciário Eleitoral, em uma disputa complicada como a que estamos assistindo, é natural que muitas das questões encerrem-se nos Tribunais.
A Justiça Eleitoral apareceu em 1932, especificamente para organizar os eleitores e dirigir as eleições. Sua criação atendeu ao clamor dos Revolucionários de 1930, que denunciavam duramente o sistema eleitoral da República Velha, onde a fraude era uma rotina.
Para garantir a lisura nos pleitos, organizar o processo de alistamento, dirigir a votação e apurá-la é que foi criado todo o Poder Judiciário Eleitoral.
Foi assim que, através da nossa história, as mais polémicas questões eleitorais (tanto de alistamento, votação e apuração) tiveram suas soluções por meio das decisões do TSE.
Nessa área nova da Justiça, o Poder Judiciário Eleitoral – para melhor realizar suas funções – tem algumas funções inovadoras e que lhe diferenciam de outros ramos do Judiciário.
Dentre as atividades de maior importância da Justiça Eleitoral está p competência do TSE para expedir “Instruções” sobre qualquer matéria eleitoral (alistamento, eleições, apurações etc.).
Estas regras procuram regulamentar a legislação: são semelhantes aos decretos emanados pelos Órgãos do Poder Executivo, com sua validade condicionada à consonância com o texto legal.
Esta competência regulamentar do TSE constitui-se em rica fonte do Direito Eleitoral, sendo de grande utilidade para a atividade partidária e o processo eleitoral. Hoje, praticamente todas as leis eleitorais dispõem que caberá ao TSE regulamentá-las através de “Instruções”.
Outra,atividade peculiar da Justiça Eleitoral – e que tanta divulgação recebe hoje dos jornais – é a competência do TSE para responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese, nunca sobre fatos concretos, por autoridade com jurisdição federal ou òrgão nacional de partido.
As respostas às consultas não envolvem julgamento, apenas contêm esclarecimentos sobre matéria eleitoral, não fazendo, portanto, coisa julgada.
Um dos graves problemas políticos que a eleição indireta trouxe para o Brasil foi o afastamento completo da Justiça Eleitoral do pleito, que é realizado pelo Colégio Eleitoral. Regulada por lei complementar nesta escolha indireta, voltamos à República Velha, quando as eleições eram dirigidas pelas Mesas dos Legislativos. Hoje, parte desta confusão toda sobre delegados, voto infiel, anulação de votos, etc, deve-ie ao fato de ter sido descartado o Poder Judiciário Eleitoral de suas funções de dirigir as eleições, tendo a Mesa do Senado assumido parte deste papel. Daí toda esta barafunda que seria facilmente resolvida se o TSE estivesse à frente do processo eleitoral, como ocorre na votação direta.
Fica, com isso, uma grave lição aos políticos: o órgão criado para organizar e dirigir as eleições, deve assumir – em toda sua plenitude – a direção do processo eleitoral. Afinal, a Revolução de 1930 foi feita para isso e a Justiça Eleitoral é um órgão especialmente criado para tanto.
(Diário Comércio & Indústria, 6/12/1984)